quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Música, Dança e Acessibilidade – Cegos e Surdos

Violino e Arco
Neste artigo abordaremos uma questão atual e importantíssima: a Acessibilidade. O que ela vem a ser; sua importância; suas possibilidades de implementação; e correlações com a Música e Dança. Dividiremos em duas temáticas – uma sobre Cegos e outra sobre Surdos; não esquecendo que existem outras temáticas que poderão ser futuramente abordadas.

Cegos:
Um dos componentes que temos para auxiliar o aprendizado em qualquer estudo (ou Arte) é o sistema escrito. Em Música temos a conhecida Partitura, ou seja, um conjunto de linhas e sinais, que possibilita uma “leitura” e interpretação dos sons e silêncios. A isto se dá o nome de Musicografia. Ora, se é um sistema musical escrito (gráfico, de: grafia, escrita), até bem pouco tempo acreditava-se que a linguagem da partitura não poderia ser aplicada em pessoas cegas ou com baixa visão. Isso felizmente mudou, graças a um programa brasileiro de computador que possibilita que as partituras sejam transcritas para o Sistema Braille.
Um pouco de História: Louis Braille perdeu sua visão ainda criança, mas aprimorou e desenvolveu um método de escrita através da combinação de pontos no papel – na forma de relevo – em 1829. Neste ano de 2009 comemora-se então 180 anos da criação e utilização do “Sistema Braille de leitura e escrita para Cegos”. Comemora-se também o Bicentenário de nascimento de Louis Braille (1809).
Sobre o programa brasileiro de computador: o que ele faz, basicamente, é transcrever as partituras que seriam impressas em tinta em partituras impressas em Braille, em relevo; ou seja, tomar um modo de escrita e passá-lo para outro de maneira que mesmo cegos possam fazer uso de leitura; que no caso é tátil, com os dedos. Isso possibilita que os músicos e compositores cegos tenham um grande avanço técnico e interpretativo e que não dependam somente do ouvido para aprenderem música. Aliás, têm-se a errada noção que as pessoas cegas têm o sentido da audição melhor desenvolvido – isso nem sempre corresponde à realidade. Contribui também para a autonomia dos cegos no aprendizado de música pois não dependerão de serem auxiliados por outras pessoas que enxergam as partituras impressas em tinta.

Surdos:
Notadamente toma-se como um fator que contribuiu para a evolução – ao menos tecnicamente – da espécie humana, a questão da linguagem. Especificamente acredita-se que o desenvolvimento também cognitivo, ou seja, de se fazer associações mentais, ocorra através dessa interação social; melhor dizendo, a transmissão de conhecimentos e aprimoramento individual se daria em razão do sistema de comunicação exercido entre os indivíduos. Ainda hoje estuda-se se a comunicação sonora teria papel primordial nisso; e a linguagem oral é a que daria mais possibilidade de desenvolvimento, portanto. Note: isso é sempre estudo e como a Educação e a Ciência estão sempre pesquisando pode-se chegar a outras conclusões e possibilidades de ação, no futuro.
E, Música e Dança? Qual a relação que o surdo tem com elas?
O som, entendido como questão física, é uma vibração. Ora, quando um caminhão pesado – e que, também, mas não necessariamente, seja barulhento –, passa em uma rua, notamos sua presença mesmo que não o ouçamos. Ele produz vibrações no meio em que ele transita, ou seja, sobre o solo e no ar. Essa vibração, ouvida ou sentida, é a mesma – guardadas as proporções – que a música faz. Então, partindo desse princípio, é possível sim o surdo apreciar Música. O surdo sente a vibração em partes de seu corpo e isso tudo tem um ritmo, um balanço; e também tem intensidade, que é o forte e o fraco – para os ouvintes, o volume alto ou o baixo. Parte-se então para outra manifestação artística: a Dança.
Em Dança o surdo consegue acompanhar visualmente dançarinos ouvintes, pois estes são “guiados” pelo som. Mas isso não lhe dá a necessária autonomia – pois o surdo dependeria de ter sempre alguém para imitar. Agora isso está mudando, pois softwares estão sendo criados e utilizados para desenvolverem o senso rítmico de surdos ao possibilitarem a estes que aprendam ritmos de maneira visual independente e mesmo com vibrações de celular. Pode-se, portanto, apresentar Música e Dança para surdos e estes poderão desenvolver-se nestas áreas. Uma das recentes publicações e que faz parte da área, entre outras, desse desenvolvimento tecnológico, é a Tese de Doutorado de Teumaris Regina Buono Luiz, na Unicamp, que resultou em dois softwares (um dos quais disponível para Download com link neste artigo). Esses softwares mostram que é possível que os surdos tenham acesso à Musicalidade e, em extensão, à Dança.

Entra-se agora na temática da Acessibilidade.
A Acessibilidade procura demonstrar e verificar de que forma está sendo realizada a inclusão de pessoas que apresentam alguma característica específica e que são conhecidas como portadoras de deficiência. Muitas pessoas assim chamadas, porém, são muitíssimo mais eficientes que as que não são assim “rotuladas”. Sim, por vezes costuma-se rotular outras pessoas para se sentir um pouco “superior”... – grande erro!
A importância da Acessibilidade e Inclusão se dá em: 1. reconhecimento das diferentes capacidades das pessoas; 2. elevações da auto-estima, da auto-imagem, da auto-eficiência e do auto-respeito; 3. inserção de métodos que aprimoram o Sistema Educacional; 4. integração social de fato; 5. busca da eliminação de alguns pré-conceitos; 6. inserção no mercado de trabalho; 7. inserção e integração em Artes; entre outros fatores.
São pequenas e ao mesmo tempo grandes conquistas para a Humanidade. A inserção social das pessoas que apresentam características específicas é possibilitada pelas descobertas da Educação e da Ciência e, com estas linhas do pensamento humano, espera-se que a busca de melhor comprometimento com aqueles que nasceram ou adquiriram alguma deficiência seja, de fato, concretizada.

Conheça mais, utilize, divulgue:
A seguir, links sobre os temas abordados neste artigo com os programas e também instituições que desenvolvem excelente trabalho de inclusão:

Musicografia Braille:
http://intervox.nce.ufrj.br/musibraille

Softwares desenvolvem senso rítmico de surdos:
http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/junho2009/ju432_pag05.php

Grupo de Pesquisas IMAGO – BPM Counter e outros softwares, como Mouse Lupa, Mouse Nose, IMAGOCR, para cegos, surdos e deficientes motores:
http://www.imago.ufpr.br/linuxacessivel.html

Fundação Dorina Nowill para Cegos:
http://www.fundacaodorina.org.br

Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação “Prof. Dr. Gabriel O. S. Porto” – Cepre / Unicamp:
http://www.fcm.unicamp.br/centros/cepre/index.php

Livros e filmes:
Conheça também o Neurologista Oliver Sacks – que escreveu vários livros (citados a seguir) sobre assuntos relativos a deficiências e sobre como as pessoas as superam, ou lidam com elas:
“Enxaqueca” (Migraine, 1970);
“Tempo de despertar” (Awakenings, 1973) – virou filme;
“Com uma perna só” (A leg to stand on, 1984);
“O homem que confundiu sua mulher com um chapéu” (The man who mistook his wife for a hat, 1985);
“Vendo vozes: Uma viagem ao mundo dos surdos” (Seeing voices: A journey into the land of the deaf, 1989);
“Um antropólogo em Marte” (An Anthropologist on Mars, 1995);
“A ilha dos daltônicos” (The Island of the Colorblind, 1997);
“Tio Tungstênio: Memórias de uma infância química” (Uncle Tungsten: Memories of a chemical boyhood, 2001);
“Oaxaca Journal” (2002);
“Alucinações Musicais (Musicophilia, 2007)”;
também neste vídeo que fala sobre “O incrível efeito da música sobre a gagueira cinética do mal de Parkinson” – mostra a importância da Música no tratamento de Parkinson e faz uma metáfora sobre gagueira e Parkinson (nota – gagueira não é considerada deficiência; é um distúrbio):
http://www.youtube.com/watch?v=yZpjiEMlFxA

E se a pessoa for cega e surda ao mesmo tempo?
Há também maneira de essa pessoa receber atenção e ser inserida no meio social. Existe uma linguagem especial criada que utiliza do toque dos dedos nas mãos para a comunicação. Há o filme “O Milagre de Anne Sullivan”, de Arthur Penn, de 1962, que mostra uma professora quase cega ensinando uma jovem que ficou cega e surda-muda aos seis meses de idade. Filme Baseado no livro autobiográfico "The Story of my Life", de Helen Keller, a jovem.
Há também o Documentário “As Borboletas de Zagosrk”, produzido pela BBC, em 1992 – este, no Youtube (6 partes), que mostra a Educação Especial. É um filme sobre uma escola para deficientes auditivos e visuais em Zagorsk, cidade próxima a Moscou. O filme faz parte de uma série chamada “Os Transformadores” -
Teacher's Story, A - Out of the Wilderness (1992);
Teacher's Story, A - Socrates for Six Year Olds (1992);
Teacher's Story, A - The Butterflies of Zagorsk (1992);
Links de “As Borboletas de Zagorsk” com áudio em Português:

http://www.youtube.com/watch?v=bA_GMtqUGeQ
http://www.youtube.com/watch?v=cTvvzBwhwvs
http://www.youtube.com/watch?v=NfkBsj2w0uA
http://www.youtube.com/watch?v=vLDROI206lw
http://www.youtube.com/watch?v=aLQ1wSbc_xY
http://www.youtube.com/watch?v=Snn6YixcU4U

Lembremos: a evolução só é possível graças às diferenças.

Arlindo G. Nicolau,
Webdesigner e Artista Plástico. Estudou Artes Plásticas e Pedagogia na Unicamp. Colaborador do Espaço Cultural Barros Junior e da ÁPC Art em eventos, propostas e temáticas.

(publicado no Jornal "Clave do Som" / atual "ExpressArte" - edição número 3 - Outubro de 2009 - Salto/SP)

Nota sobre a edição de Setembro (recorrigindo: Outubro), no artigo “Música, Dança e Acessibilidade – Cegos e Surdos.” – onde está: “Neste ano de 2009 comemora-se então 170 anos da criação e utilização do “Sistema Braille de leitura e escrita para Cegos”., o correto é: Neste ano de 2009 comemora-se então 180 anos da criação e utilização do “Sistema Braille de leitura e escrita para Cegos”.

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